Irreversível é famoso pela cena aterrorizante de quase15 minutos de estupro. Em geral o filme conta a história de um casal de namorados que está numa festa. A personagem Alex (Mônica Bellucci) se desentende com o companheiro Marcus (Vicent Cassel) e decide ir para casa sozinha. Ao sair da festa é duramente violentada em um túnel.
Porém, o filme não é guiado pelo sentido horário. Tudo começa pelo fim, como tudo acabou. A revolta do namorado e do amigo da moça, querendo achar o criminoso. O sentimento de vingança.
Ficamos perdidos no começo, porque só vamos entender a razão de tamanho desespero quando descobrimos o que aconteceu com a moça. Uma das primeiras imagens choca o público pelo ato brutal de violência que Pierre (Albert Dupontei), amigo de Alex e Marcus, comete sobre o rapaz. Ele utiliza um extintor de incêndio para matá-lo, são golpes consecutivos contra a face. É uma cena perfeita, quem sente algum tipo de repulsa, melhor não assistir essa parte! É realmente, horrível o sofrimento!
Como não sabemos o porquê daquilo, julgamos como o pior ato do mundo. Pra que agir com tanta violência? Eu mesma fiquei me perguntando. Nossa, o que o rapaz fez para ser assassinado desse jeito? Claro que nenhum ato de violência é preferível. Mas, vemos, por exemplo, alguém morrer com um tiro e pronto, ao assistir, pelo menos não dói tanto. Mas existem mortes, como é o caso dessa cena, que são cometidas para pessoa sofrer mesmo o quanto puder. E você parece sentir a dor da pessoa. A cada pancada, uma nova sensação.
Mas com o tempo, vão se revelando os “porquês”. A câmera às vezes me deixou tonta com tantos rodopios. Mas conclui que era para representar mesmo o desespero dos que ficaram. Você já entra nesse clima. Eu achei de uma riqueza esse filme, até no começo, tem os créditos que aparecem no final.
Mas a pior cena de todas é a do estupro, e depois o contexto que se forma. O sofrimento da moça. É terrível. Fico imaginando como as mulheres que sofrem esse tipo de atentando lutam para sobreviver. É realmente a pior coisa que existe no mundo. Eu sentia a dor. Eu sentia o desconforto, desespero. Nossa, é horrível. E como se não bastasse, o troglodita ainda a espanca no fim. É duro de assistir.
A partir daí, o filme que tem imagens escuras, vai se tornando claro, as conversas ficam suaves. E é desse ponto em diante, que se torna um belo filme de amor, nos deixando com remorso e ódio ao mesmo tempo. Primeiro porque você já sabe tudo o que aconteceu. Segundo que você o fim é de alegria. Mostra o romance do casal. Coisas simples, sabe? Por exemplo, quando acabamos de acordar, todos dois nus na cama. E trocam carinhos. Conversam. É, lindo demais. E você com aquele sentimento, de que tudo isso não existe mais! É terrível, e ao mesmo tempo lindo!
Irreversível, é como a juventude que se aproveita uma única vez na vida, depois, o tempo passa e não volta mais. Irreversível, faz com que a gente queira realizar tudo que nós não fizemos antes,
“Clichêzando” um pouco, se você puder, não deixe para fazer amanhã o que você pode fazer hoje. Vai por mim...começando por assistir esse belo filme, que ainda tem mais uma surpresa, só que não contarei, claro, que vai te deixar com mais ódio ainda.
Já que falei de tempo... irreversibilidade...presenteio vocês com a poesia de Mario Quintana...
AH! OS RELÓGIOS
Amigos, não consultem os relógios
quando um dia eu me for de vossas vidas
em seus fúteis problemas tão perdidas
que até parecem mais uns necrológios...
Porque o tempo é uma invenção da morte:
não o conhece a vida - a verdadeira -
em que basta um momento de poesia
para nos dar a eternidade inteira.
Inteira, sim, porque essa vida eterna
somente por si mesma é dividida:
não cabe, a cada qual, uma porção.
E os Anjos entreolham-se espantados
quando alguém - ao voltar a si da vida -
acaso lhes indaga que horas são...
Mario Quintana - A Cor do Invisível