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Monday, May 25, 2009

Ele me fez entender o que era o papel de um avô no teatro da vida


Eu cresci rodeada de avós. Cada uma com suas peculiaridades. Uma católica doente. A outra, digamos que um símbolo de feminismo para mim. Independente, inteligente traçava o caminho que gostaria de seguir.

Bem cedo, perdi o meu avô paterno. Quase não tenho lembranças dele. Convivi muito pouco do que gostaria de conviver. Apenas sei que era sanfoneiro. Talvez seja dele as minhas raízes musicais.

O materno nem cheguei a conhecer. Era policial. Faleceu quando tentava pegar um bandido.

Depois de anos orfã de velhinhos, recebo a notícia que a minha avó materna conheceu uma pessoa bacana e revolveu se casar outra vez. Eis que conheço um senhor chamado Rodrigo Passinho.

Como eu tinha uns oito anos, bem novinha ainda, sentia muito ciúme de minha avó Anésia. Não queria que ela se casasse de jeito nenhum. Não tinha quem me fizesse gostar do tal velhinho.

Não demorou muito para essa concepção imatura se desligar de mim, e com pouco tempo de presença ao lado desse senhor, ele já tinha conquistado um lugar reservado no meu coração.

Alegre. Esse é o adjetivo que qualquer pessoa pode falar sobre o meu avô. Estava sempre bem humorado, um grande sorriso no rosto e muitas histórias a contar. Era um verdadeiro exemplo de pessoa do bem.

Quando era jovem, morava na roça no interior da Bahia. Não tinha mordomias. Trabalhava com o pai para o sustento da família. Com seus quase vinte anos resolve ir para Salvador estudar. Consegue se formar em Bioquímica. Dá a volta por cima, e se torna um dos melhores profissionais de sua área.

Casa-se. Tem três filhos, duas meninas e um menino. O casamento não dá certo.

Separa-se.

A velhice chega. Não querendo incomodar filhos e parentes, muda-se para o Abrigo de Salvador. E lá conhece a minha avó, seu futuro amor.

Quem disse que quem se apaixona são apenas jovens? Eles se amaram até o ultimo momento.

Lembro que ano passado, no aniversario da minha avó, eles vieram para Feira de Santana, ficaram aqui em casa. Meu pai chamou um amigo que canta e toca teclado. E todos dançaram. Mas não igual aos dois. Era um companheirismo que transbordava inveja a quem observava. Os dois não pareciam carregar o peso de anos nas costas. Estavam de corpos colados e giravam, giravam, sempre com os olhos na mesma direção. Um ao encontro do outro.

Depois meu avô pediu para que fizesse silêncio. Fez uma linda declaração de amor para minha avó. A mais bela mensagem de amor já vista por mim. Não tinha dúvida de que tudo aquilo era simplesmente verdadeiro.

Com meu avô aprendi os cuidados com a vida. Ele foi a primeira pessoa que chegou a mim para conversar sobre sexo. Falou-me do uso da camisinha. O quanto era importante à prevenção. Incentivou-me a buscar em primeiro lugar o objetivo do meu estudo. Sempre falava “Estude sempre, seja independente, dê valor ao sacrifício de seus pais”. E foi assim que segui e sigo minha vida. Totalmente influenciada por suas palavras de ajuda, conforto e carinho.

Há alguns dias ele já não vinha se sentindo bem. Eu tinha esperança que ele ficasse bom como da última vez que esteve doente e melhorou. Ontem não. Não foi assim que aconteceu. Ele se foi. Despediu-se de todos. Mandou dar tranqüilizante a minha avó. Deixou tudo preparado à chegada do seu fim. Ele já sabia.

A última vez em que o vi, ha umas três semanas ele estava diferente. Sério e triste. Não parecia ser o meu avô. Fiquei incomodada com aquela situação. Logo ele, que estava sempre conversando, rindo. Estava sentado numa cadeira, bastante acima do peso e os lábios completamente cerrados.

Tratei de eliminar essa imagem. Injetei doses de esperança em mim mesma. E ontem não consegui entender o por quê de uma pessoa tão boa ir embora para sempre. "É tão estranho, os bons morrem antes, assim parece ser, quando me lembro de você que acabou indo embora, cedo demais.

Esse texto foi para homenagear uma pessoa muito querida. Não era uma pessoa comum, era uma pessoa especial, não porque fez parte da minha vida. Mas porque era o senhor que fazia da vida um espetáculo. Um espetáculo de emoções, positividade, generosidade e todos os infinitos adjetivos que poderia aqui mencionar.

Rodrigo Passinho era uma daquelas pessoas que a gente já fica feliz só de estar ao lado. É raro encontrar esse tipo de pessoa. E ele era uma delas.

Abaixo segue a música, que para mim é a trilha sonora de seu encontro com minha avó, Último Romance, de Los Hermanos.

Vô TE AMO, que falta você já está fazendo! É difícil se conformar em não ter mais o seu sorriso, as suas histórias, piadas, o seu encanto que fazia de você a pessoa maravilhosa que você era. Fica em paz.


Último Romance
Los Hermanos
Composição: Rodrigo Amarante
Eu encontrei-a quando não quis
mais procurar o meu amor
E quanto levou foi pr'eu merecer
antes um mês e eu já não sei

E até quem me vê lendo o jornal
na fila do pão sabe que eu te encontrei
E ninguém dirá que é tarde demais
que é tão diferente assim
Do nosso amor a gente é que sabe, pequena

Ah vai!
Me diz o que é o sufoco que eu te mostro alguém
afim de te acompanhar
E se o caso for de ir à praia eu levo essa casa numa sacola

Eu encontrei-a e quis duvidar
Tanto clichê deve não ser
Você me falou pr'eu não me preocupar
ter fé e ver coragem no amor

E só de te ver eu penso em trocar
a minha TV num jeito de te levar
a qualquer lugar que você queira
e ir onde o vento for, que pra nós dois
sair de casa já é se aventurar

Ah vai, me diz o que é o sossego
que eu te mostro alguém afim de te acompanhar
E se o tempo for te levar
eu sigo essa hora e pego carona pra te acompanhar
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