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Thursday, August 11, 2011

Meu abrigo, o asilo



Hoje é o dia da visita. Nos primeiros meses esperava ansiosamente a chegada dos meus filhos, mas as coisas mudaram. Conheci pessoas como eu, deixadas para traz, abrigadas num lugar sem amor, apenas viver por viver.

Eu que era jovem, bonita, fui até mesmo dançarina aos 18 anos e hoje estou aqui, colocando um vestido rosa, um sapato sem salto, sem graça e um batom vermelho para disfarçar o formato entristecido da boca.

Tenho o meu ritual nesses dias. Ligo o som, coloco uma música antiga, danço um pouco, lembro os tempos da juventude e consigo recuperar um pouco da felicidade vivida só para demonstrar aos meus filhos que não ando tão triste assim.

Eles chegam. Abraçam-me, contam percursos da vida, alguns até já presenciei, não há graça em ouvi-los. Por vezes, me perco em pensamentos e eles pensam que estou com problemas, ou Mal de Alzheimer.  Para falar a verdade, eu esqueço facilmente a conversa boba de família.

Aquele contato não é o que sentia há anos atrás quando morava numa casa cheia de netos, problemas, confusões, coisa normal da vida. O asilo me ensinou a ser triste, foram tantos momentos de saudade que saudade matou a realidade, e de sonhos vivo eu.

Sinto necessidade de solidão, mas não recuso a visita dos meus filhos, seria injusto, mãe malcriada, desnaturada, ou coisa do tipo assim me chamariam. Eu fui perdendo valor, a casinha que antes era minha, agora é da minha nora que chora e chora por não saber controlar o destino do meu filho.

E eu que tinha o brilho da juventude aos 60, passei os 70 e 80 assim, num quarto maltratado, com cheiro de umidade, e bolacha salgada com água para animar as tardes.

Eles trouxeram presentes, perfumes, maquiagem, vestidos, coisas das quais já não fazia questão de ter, o que tinha bastava. Traziam também olhares tristes, carregados pela culpa de me ver naquele estado, mas levar-me de volta para casa não era a solução.

Eu até dava sinais de que queria voltar, nas conversas, lembrava dos momentos passados, os olhos enchiam de água, mas não podia obrigá-los a me querer em suas companhias. Mamãe tem que se conformar com o lar.

Eles acham que os velhinhos me animam. Todos na mesma faixa etária, experiências a compartilhar. Ilusão, grande ilusão. Cada um no seu universo de abandono, círculo de tristeza, pés fora do chão, o asilo nada mais é que a espera da morte e o milagre da salvação.  
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